“Fazemos parte de uma sociedade conectada, cuja principal característica é a rapidez na comunicação, que por sua vez geram relações jurídicas e consequentemente responsabilidades. Ocorre que, diante da evolução tecnológica, somos ainda da era analógica, ou seja, passamos por um momento de transição, enquanto as crianças e adolescentes já nasceram na era digital.”
Cristina Sleiman, do site Direito, Tecnologia e Educação
“(…) as tecnologias digitais trazem possibilidades interativas para a educação as quais, aparentemente, ainda não foram, genericamente, incorporadas nas práticas docentes, independentemente à adoção, ou não, dessa nova linguagem. Tais possibilidades interativas podem trazer para a docência novos encaminhamentos quanto ao processo de aquisição do conhecimento pelo aluno.”
Valéria Roque, colunista do site Webinsider
Com as citações acima, sublocadas de artigos sobre a associação da evolução digital com a função da escola, chama-se a atenção para a problemática evocada em meus anos de discussão em reuniões pedagógicas: a de que os avanços da tecnologia e a produção de conhecimento caminham numa proporção tal que o papel da escola como “centro do saber” é colocado em xeque. A primeira consequência do processo é a contestação do processo de aprendizagem como único meio possível de adquirir/desenvolver as competências e habilidades definidas como a base do currículo. Discutir acerca desse impacto e de como transformar a educação dentro do contexto é a tônica que deve constar no preparo dos docentes desta geração.
A era digital, como costuma-se definir em exaustivos debates sobre o século XXI, sedimentou-se a partir de um processo secular que remete às origens da industrialização da sociedade civilizada.
Partindo do princípio de que somos produto da sociedade industrial, estamos sujeitos ao caminhar do progresso do sistema – o qual produz tudo o que consumimos. Referindo-se à antiga pirâmide social, alegoria elaborada para esclarecer a hierarquia dos postos de trabalho, devemos relembrar que as bases do trabalho eram, outrora, ocupadas pelo trabalhador braçal, classe proletária, responsável pela sustentação dos níveis superiores, tais como encarregados e diretores. Podemos usar essa alegoria de empréstimo para ilustrar o sistema escolar, o qual, há tempos, acaba por excluir alunos em níveis mais complexos de ensino, dando mais atenção aos que melhor se destacam. Um exemplo empírico do raciocínio é a evasão no Ensino Médio, assunto tratado constantemente na mídia.
Tal estreitamento da base produtiva reflete diretamente na escola, pois o antigo modelo de sociedade industrial dispunha de espaço para os menos qualificados, o que não onerava a responsabilidade da educação. Com a terceira Revolução Industrial, que trouxe a substituição do homem pela máquina, o sub-qualificado não encontra mais lugar e acaba por preencher vagas em gêneros de emprego marginalizados e até criminosos, com o comércio de produtos piratas e o tráfico de drogas. Para não cair em armadilhas pseudo-filosóficas de fórmulas utópicas pretensas em resolver tal panorama complexo, é necessário que os profissionais da educação estejam cientes de que a sociedade muda e que o mundo, a cada geração, exige que novas habilidades e competências sejam consideradas no currículo. E até essa concepção oferece desafios constantes capazes de intimidar o mais experiente e esclarecido profissional, a ponto de alimentar a sensação de uma virtual impotência didática (sintoma cada vez mais freqüente nas conversas de intervalo entre as aulas).
Com o interesse de pontuar o foco das atualizadas habilidades e competências do currículo, é possível até enumerar, valores e atitudes que o aluno precisa assimilar ao fim dos estudos:
- Domínio da multiplicidade de linguagens;
- Saber usar recursos tecnológicos e sistemas de informação;
- Adaptação diante de mudanças contínuas;
- Filtragem do excesso de informações;
- Interesse pela cultura;
- Argumentação prática e lógica (ética vs. estética).
Ao professor atual, cabe a percepção de que o progresso, tanto científico quanto tecnológico, prossegue numa velocidade própria e cuja influência é real e atuante sobre o corpo discente, muito mais sensível às novidades que a geração anterior. Tal facilidade de adaptação à evolução é típica da juventude, ainda que em um aspecto mais próximo do mercado de entretenimento. A despeito disso, é até prepotente a estereotipação do jovem-fútil, ser submetido às superficialidades da tecnologia tais como o universo dos videogames, cujo mercado vem crescendo juntamente com a dita globalização econômica.
Sendo assim, a aquisição de portáteis eletrônicos tais como mp4, celulares e mini-games pelos jovens e a desenvoltura como lidam com esses instrumentos reflete na dinâmica da sala de aula: podemos até afirmar que a maneira de lecionar, com os alunos perfilados e em silêncio, é cada vez mais mal vista por muitos profissionais da educação. Apesar da comicidade da declaração, tal ideia dispõe de uma seriedade tão verdadeira e atual, que os envolvidos no processo de ensino estão sujeitos à adaptação urgente das metodologias, sob pena de sofrerem maiores dificuldades no cotidiano de trabalho. E de se tornarem obsoletos.
Citando livremente o jornalista André Forastieri, em seu artigo Chega de Escola, “está totalmente na cara que a rapaziada de todas as classes sociais está igualmente equipada para lidar com o mundo moderno. Especialmente no Brasil. Afinal, todo mundo por aqui vive a mesma experiência audiovisual/interativa. O moleque da periferia ouve música, assiste à televisão e joga videogame tanto quanto o filhinho de papai do condomínio. Ambos já estão com um pé dentro da economia digital.” (sic) Desse modo, o professor deve ter em pauta no planejamento que o conhecimento enciclopédico e sua transmissão em aulas expositivas deixaram de ser úteis na sociedade moderna, no ritmo em que as informações se multiplicam em nossa famigerada era digital. O volume crescente de dados ao qual um cidadão está exposto, e a consequente facilidade de consulta para uso prático, são fatos que refletem na produtividade em sala de aula: não raro testemunhamos casos de alunos que fazem uso de “gadgets” em conexões rápidas para obter dados para pesquisas solicitadas pelos professores. A interação é a palavra-chave, e relacionar conteúdos disciplinares com o mundo em questão e suas aplicações práticas tornou-se o eixo da didática universal.
Afinal, o acúmulo de conhecimentos da civilização humana cresce exponencialmente a cada ano, e transmitir tal montante nas aulas, ainda que numa fração insípida, é praticamente impossível. Há quem diga que o conhecimento humano vai dobrar a cada segundo a partir de 2017. E, com isso, pergunta-se: qual o mínimo necessário de conhecimento uma pessoa precisa ter para viver razoavelmente bem em seu meio? Qual a garantia que temos de que a escola é realmente imprescindível hoje? Na intenção de finalizar este artigo (sem a pretensão de uma conclusão, visto que o tema é inesgotável), reitera-se a pergunta: para que mundo estamos educando?
Rodrigo da Silva (nome real de Rodrigo Bazílio)
Fontes:
A linguagem das coisas, de Deyan Sudjic. Editora Intrínseca.
Sites: andreforastieri.com, educacao.uol.com.br.
http://webinsider.uol.com.br/2006/11/09/o-papel-das-tecnologias-digitais-no-contexto-escolar/
http://sleiman.com.br/blog/?p=6
4 maio, 2015 at 16:38
gostei muito do texto,me ajudou muito na minha pesquisa.Obrigada
31 julho, 2020 at 20:00
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